quarta-feira, 3 de junho de 2009

e-Democracia, porque a Rede Social da Câmara não vai funcionar?

Hoje foi um belo dia para aqueles que acreditam na Internet como meio de fortalecer a democracia. A Câmara dos Deputados lançou a sua rede social com o intuito de estimular a participação popular: e-Democracia.



E digo que o dia foi bonito porque isso prova que a Casa tomou a iniciativa de fazê-lo, mostrou que acredita na Internet e reconhece os frutos que virão de tal projeto.

Porém, a parte otimista do post acaba por aqui. Já que é possível que na verdade os comandantes da Câmara não acreditem em nada, e esta seja simplesmente uma ideia que eles resolveram apostar como uma maneira de gerenciar a crise da falta de prestígio do Congresso.

Ao visitar a e-Democracia, já de início percebe-se que está ainda inacabada, em fase de testes. Basta tentar se cadastrar para ter a constatação:

- 2 emails de confirmação de cadastro, sendo um deles do Gmail (?!);
- Links que não funcionam -- problema também constatado pelo Blog do Tom;
- Email de "confirmação da confirmação" em Inglês: "Your http://www.edemocracia.camara.gov.br membership has been approved. Please return to http://www.edemocracia.camara.gov.br to log into http://www.edemocracia.camara.gov.br." (esse ao menos vem do email edemocracia@camara.gov.br);
- Front-end da rede em Inglês (você tem que mudar a Língua no seu perfil se quiser o Português);
- Foto do perfil do usuário é limitado a míseros 200Kb.

São detalhes como esse que provam que a plataforma não estava pronta para ser lançada e não passou por testes básicos antes de vir a público, o que é muito preocupante.

Dito isso, não creio que o cadastro como as áreas da rede com palavras em Inglês , seja o pior dos problemas, já que devem e podem ser consertados facilmente.

O que me preocupa é a lógica da rede participativa, já que a falta de conhecimento e experiência da equipe da Câmara na área de Governo 2.0, lhe fizeram criar fórmulas "nuncas antes vistas ou navegadas no mundo" para promover a participação.

A primeira lição que se aprende com os pioneiros em iniciativas participativas é que "não devemos reinventar a roda", isso quer dizer que se já existem soluções para determinados problemas. Porque reinventá-los? Ou seja, por que não adaptar uma das tantas iniciativas de sucesso dos EUA? Ô Temer, o sucesso seria garantido e com (um bem provável) investimento menor.

Mas ao invés de perguntar "porque não copiaram iniciativa tal ?", eu prefiro analisar mais a fundo e abordar a provável linha de pensamento dos Gurus em Internet na elaboração do projeto:

Problema observado por eles: "a Internet é um ambiente caótico, que não existe controle e supondo que teremos uma efetiva participação de centenas de milhares de pessoas, não poderemos acompanhar ou fiscalizar todas as opiniões do público".

Solução pensada por eles: "Fazemos então 2 grupos de discussão: um para o povão e outra para uma elite, que será limitada e organizada":


- o do povão: "Espaço Cidadão", para os não especialistas: que na prática deve servir só pra justificar que o site está aberto para todos -- que todos são bem-vindos. Mas na prática tem tudo pra virar apenas estatística, já que os temas serão debatidos "de verdade" pelos especialistas que comporão o outro grupo de discussão.

- o da elite: "Comunidade Virtual", para os especialistas, aqueles que compõe a cena política atual e de acordo com o tema de cada comunidade, colaboradores de empresas que tenham como especialidade a comunidade abordada.

A 1ª preocupação é a de como tais especialistas serão escolhidos? Baseados em que critérios? Quem fará a moderação? Já que na prática, essa sim será onde um debate construtivo será realizado.

A verdade é que este modelo não funciona. Discriminar a participação separando leigos de especialistas não garante um debate organizado. O que falta é a criação de formas de avaliação e criação de rankings e maior liberdade ao usuário por exemplo.

A e-Democracia não permite que o usuário inicie temas ou comunidades de discussão (até o momento, só podemos debater sobre o Meio Ambiente), isso quer dizer que ficará nas mãos de Michel Temer os temas que ele quer que debatamos e quem deve debatê-los! Sejamos sinceros, isso combina com Democracia? E vamos combinar, muito esperto começar com Meio Ambiente, não?! Já que que é um tema que ninguém é doido de contrariar. Fica claro cada pedacinho de tentativa de estratégia criada para o lançamento.

Como isso deveria ser feito?

São várias formas, exitem modelos muito mais amplos que teriam a capacidade de gerar uma real discussão de temas em todos os níveis e áreas do nosso país! Mas creio que este deve ser o tópico de outro post.

Partindo então da estrutura atual da e-Democracia, detalho exemplos do que falta à estrutura do projeto:

- Capacidade de procurar propostas de leis através dos temas, de autores, por importância (votada pelos usuários), por estados beneficiados, mais discutidas, mais vistas, mais bem avaliadas;
- Capacidade de voto positivo ou negativo em temas de dicussão e em cada comentário (assim como fazemos no YouTube);
- Ranking também de usuários: mais bem avaliados, mais ativos...

E claro, também estratégias de RP e nas outras redes e mídias sociais já presentes na web. Que a Câmara desconhece.

Especialistas podem entrar como convidados e terem suas propostas em destaque (com vídeos por exemplo), mas nunca em separado.

A rede deve disponibilizar métricas que sejam capazes de fazer o próprio usuário DEMOCRATICAMENTE expor suas idéias, abrir seus temas, contar as peculiaridades do seu município e então ter os seus pontos de vista apoiados ou não pela própria rede e não um funcionário da Câmara. (A Casa não vai querer seguir esse molde para depois ser comparada com censura de ditadura, ou vai?)

É preciso ser bastante cuidadoso com tudo isso.

Uma estrutura ideal de debate não se contrói da noite pro dia, você deve convidar os usuários, adaptando a cada realidade, para tê-los fazendo parte de todo o processo.

Me resta desejar boa sorte à equipe da e-Democracia na Câmara, para que consigam realizar as mudanças necessárias.

Postado também no Tática Política.

4 comentários:

Unknown disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Unknown disse...

Olá Bruno,
Sou estudante universitário, de São Paulo.
Acompanho seu blog há algum tempo já. Primeiro, parabens pelo trabalho e pelo currículo que carrega.
Deveria ter comentado no post sobre o seminário sobre transparência, mas enfim.
Gostaria de saber se há alguma previsão para que se equacione um econtro desse tipo no Brasil, com participação universitária e de entidades como contas abertas, voto consciente e outras organizações que tentam melhorar a política no país.
Parabens de novo.
Victor Scalet, 18, São paulo.
(enviei um e-mail com mais informações para: tvpolitica@gmail.com)

Bruno Hoffmann disse...

Boa pedida Victor.

Novidades neste sentido surgirão ainda este ano ou início do próximo.

Pode deixar que aviso aqui.

Obrigado! Abs.

Wedis disse...

Eu acredito em uma esfera pública virtual. Um lugar onde se possa fortalecer a democracia. Mas, é preciso a existência de um meio eficiente para isso. O que pareçe não haver, por enquato no site criado.

E, como diz Rousiley Maia, em 'Redes cívicas e internet: do ambiente informativo denso às condições da deliberação pública', "para fortalecer a democracia são necessárias não apenas estruturas comunicacionais eficientes e instituições propícias à participação. Mas, também devem estar presentes a motivação correta, o interesse e a disponibilidade dos próprios cidadãos para se engajar em debates".

Que as pessoas acessem, vejam os erros, reclamem e consigam fazer a democracia!